No estúdio
montado em casa produziu sua discografia, os três CDs: Nêutrons - partícula
n. 1 (2011), Figuras de linguagem (2011) e Impune (2013). Com
voz grave e inconfundível, o rapper Átomo U-Sal propaga sua ideologia
denunciando a banalização da fé, o consumismo, a política nefasta e outros
temas inerentes a sociedade brasileira. Este poeta urbano de versos atômicos é
o nosso entrevistado desta semana.
Alessandro Swinerd: Quando despertou seu interesse pelo Hip-Hop?
Átomo
U-Sal: Por volta de 1996, através dos Racionais MC’s.
AS:
E como percebeu a possibilidade de se tornar letrista e rapper?
AU:
Antes
mesmo de escrever letras de rap, eu já fazia outras influenciadas por bandas de
rock dos anos 80, como Legião Urbana, Engenheiros do Hawaii e Barão Vermelho.
AS:
Pode me explicar esta concentração de rappers em Nova Iguaçu. Principalmente no
bairro Morro Agudo?
AU:
É
algo que aconteceu de modo natural, já que ninguém se conhecia. O agente
(U-Sal) começou na MAB (Movimento das Associações de Bairro) em Nova Iguaçu, e
foi lá que conheci o Dudu de Morro Agudo, depois Fator Baixada e Léo da XIII,
aí juntamos força na nossa área, aí vieram os outros.
AS:
Suas
músicas primam pelas questões sociais, mas em algumas há uma visão irônica dos
fatos – inserções de uma risada com tom ácido. Por quê?
AU:
Eu
escrevo de acordo com o projeto que estou realizando no momento, uns tem um
abordagem mais séria, outras mais descontraídas, como no caso do CD “Impune”,
mas nem por isso menos sérias.
AS:
Qual o motivo da constante referência à mula falante do profeta Balaão?
AU:
A
mula falante é do “Impune”, o das risadas ácidas. É um dos meus
alter-egos, no primeiro disco “... Dando o Ar Da graça”, eu falo
principalmente da corrupção e legalismo dentro do sistema religioso. Tendo como
base a graça de Deus, que lança por terra todo o peso da acusação.
AS:
Você
sofre algum preconceito no movimento Hip-Hop por crer na doutrina do
Cristianismo?
AU:
Não.
Dentro do Hip-Hop há a questão de respeitar o discurso alheio, ainda que não
concorde com ele. Além do mais, eu não uso o termo “gospel” que em minha
opinião, só serve para fazer comércio e separação dos demais. Ninguém diz que
faz rap candomblé, rap católico etc. Eu faço rap simplesmente, a mensagem
cristã é natural.
AS:
Todos seus trabalhos são independentes? Como realiza o processo de produção,
distribuição e divulgação dos CDs?
AU:
Sim,
todos são independentes. Produzidos, gravados, mixados e masterizados na minha
casa, com algumas pequenas exceções. A questão da distribuição e divulgação é
sempre gratuita, pela internet, e também através do material físico nos
eventos.
AS:
A
distância dos grandes centros artísticos inibe a visibilidade das manifestações
culturais que estão ocorrendo na periferia?
AU:
Acredito
que sim, mas eu não me importo com isso, eu faço meu trabalho simplesmente. Eu
não me preocupo com o público, a crítica etc. Sou muito cru pra pensar em
jogadas de marketing, pra romper essa distância.
AS:
Sendo
um dos representantes da cultura negra na Baixada Fluminense, que medidas devem
ser tomadas pelo governo municipal e estadual para restituir estas décadas de
descaso com os afrodescendentes?
AU:
Sou
favorável às políticas públicas de auto-afirmação, principalmente pelo fato de
achar que isso funciona como uma indenização pelos séculos de trabalho não
remunerado. Algumas coisas estão melhorando, mais acho que ainda falta muito
para termos uma posição melhor. No meu caso, eu não espero pelo governo e nem
pelas organizações negras, diariamente eu milito no trabalho, em casa e na rua.
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